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Terça-feira, 22 de Junho de 2021, 09h:50 - A | A

Trabalhador essencial, a maior vítima da pandemia

Na segunda onda da pandemia, funções como as de caminhoneiros, porteiros, vendedores do comércio e motoristas de ônibus estão entre as que tiveram mais desligamentos por morte.

Este levantamento nacional mostra a importância da luta do Sintrobac pela vacinação da categoria, vitória que foi possível graças à dedicação do sindicato.

 

Apesar de já ter provocado mais de 500 mil mortes no País, os efeitos da pandemia de Covid-19 têm sido desiguais entre os brasileiros. De acordo com dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) – órgão do Ministério da Economia que têm como base os trabalhadores formais –, há um segmento que pode ser considerado a maior vítima da pandemia. Trata-se dos trabalhadores dos serviços essenciais – aqueles que não pararam durante a crise sanitária.

 

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Invariavelmente, essa mão de obra é invisível. São trabalhadores que têm baixa remuneração ou não puderam aderir ao trabalho remoto, nem manter níveis seguros de distanciamento social. Por isso, foram os que mais sofreram nos últimos meses no exercício de suas profissões.

No segundo bimestre, em meio à segunda onda da pandemia, funções como as de caminhoneiros, porteiros, vendedores do comércio e motoristas de ônibus estão entre as que tiveram mais desligamentos por morte: foram 66 mil óbitos em março e 82 mil em abril. Os registros de contratos formais encerrados por óbito no Caged saltaram 159% – de 8.821 no segundo bimestre de 2019 para 22.837 no mesmo período deste ano.

 

Entre os motoristas de caminhão, foram registradas 1.449 mortes em março e abril, o maior patamar entre as ocupações e um aumento de mais de 223% em relação ao mesmo bimestre de 2020 (ainda no início da pandemia no Brasil). Na comparação com o mesmo período de 2019, antes da crise sanitária, a alta é ainda mais expressiva: 407%. “Por circularem intensamente, os motoristas de caminhão, além de serem as maiores vítimas de óbitos, podem ser também vetores do vírus e suas variantes entre os estados e regiões do país”, diz Elvis Cesar Bonassa, diretor da Kairós Desenvolvimento Social.

A vacinação lenta e a falta de previsibilidade na rotina prejudicam a imunização desses profissionais. Na comparação com o período pré-pandemia, houve aumento nas mortes de vigilantes (alta de 234%), vendedores do comércio (187%), porteiros (147%) e faxineiros (97%), conforme dados Caged compilados pela Kairós. Pesa para muitos desses trabalhadores, ainda, a necessidade de deslocamento entre residência e trabalho por meio de transporte público, o que aumenta o risco de contágio.

Um estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) revelou que no fim de 2020, do total de pessoas em trabalho remoto, 76,1% tinham nível superior completo, 31% tinham entre 30 e 39 anos e 65,4% eram brancas. Sob pressão de entidades patronais, o Ministério da Saúde incluiu trabalhadores do transporte – caminhão, ônibus, metroviários, ferroviários, aéreo e aquaviário – entre as profissões prioritárias no Plano Nacional de Vacinação, assim como trabalhadores portuários, de indústrias e da limpeza urbana.

 

De acordo com o Ministério da Saúde, até o fim de maio, mais de 95 mil doses do imunizante foram aplicadas em trabalhadores do transporte. De acordo com a CNT (Confederação Nacional do Transporte), os estados que mais vacinaram esses profissionais até agora foram São Paulo, Bahia e Maranhão.

Apesar de gravemente expostas ao risco, sete entre as dez ocupações com mais mortes registradas pelo Caged não foram incluídas como prioritárias para receber a vacina, segundo edição do Plano Nacional, publicada em maio. No caso de porteiros, zeladores e demais trabalhadores em condomínios, os sindicatos pediram a inclusão desses profissionais como prioritários em nível nacional. Com a falta de diálogo, as entidades de trabalhadores também​solicitaram a inclusão a governos estaduais e municipais.

A CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) e a CNTC (Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio) também pediram ao Ministério da Saúde para que os trabalhadores do comércio fossem incluídos no grupo prioritário de vacinação. Segundo o Sindicato dos Comerciários de São Paulo, não houve resposta por parte do governo.

 

A análise dos dados mostra que as dez ocupações mais expostas a risco de morte no segundo bimestre de 2021 concentram 30% de todos os desligamentos por morte de trabalhadores. Além deles, há um exército de informais (como entregadores, diaristas e ambulantes) que, apesar de igualmente expostos ao vírus, não entram nas estatísticas de trabalho com carteira assinada.

Em 2020, após uma mudança de metodologia no Caged, passou a haver uma maior notificação de empregados temporários. Isso elevou a quantidade de trabalhadores registrados pela pesquisa, o que prejudica a comparação da série histórica do número total de empregos.

Segundo Bonassa, no caso dos óbitos, a participação das modalidades de trabalho temporário é inferior a 1%. Para os caminhoneiros, por exemplo, eles representam 0,5%. Por isso, a comparação com as duas metodologias tem baixo impacto no comportamento da série histórica.

 

Embora o Caged aponte o número de contratos encerrados por morte do trabalhador, o cadastro não diz a causa da morte. Ou seja, não é possível atribuir todo o aumento no número de mortes à Covid. Bonassa ressalta, no entanto, que o principal fator que pode explicar esse aumento é a pandemia. “Não há outra mudança no cenário que possa ter causado esse impacto. Mesmo que algumas ocupações tenham subido mais que outras, o aumento de óbitos foi generalizado”, afirma.

 

Segundo outro levantamento, do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), mesmo para os profissionais da linha de frente que foram mais priorizados na vacinação, como os da área de saúde, houve grande impacto. A alta nas mortes entre o primeiro trimestre do ano passado e o mesmo período deste ano foi de 75,9%.

“A pandemia levou a uma perda de capital humano e a uma queda na renda para essas famílias”, diz a economista da entidade Rosângela Vieira. “Por mais que essas famílias sejam amparadas por uma pensão por morte, é uma renda muito menor e isso vai ter impacto no futuro.”

 

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